Sem dúvidas a cozinha é a parte mais
aconchegante de uma casa. Se analisarmos bem, os melhores momentos que temos no
dia dentro de casa acontece dentro da cozinha. Não raros, somos pegos lembrando
de momentos de nossa infância que aconteceram dentro dela, junto com a família
e amigos. Ao se chegar em casa, éramos sempre levados a ir para a cozinha.
É da cozinha que vem os cheiros e
aromas que nos perseguem por toda a vida. Quando o dia amanhece, é de lá que
surgem as primeiras vozes e os primeiros sons que nos acordam. O cheiro do café
fresquinho também vem de lá. Sobre a mesa, sempre havia uma garrafa de café,
com xícaras e copos, ao alcance de todos. A cozinha exerceu por muito tempo o
papel de unir e de transmitir afeto.
Quando entramos em casa, cansados,
exaustos, é pra cozinha que quase sempre nos dirigimos, em busca sempre de algo
para nos envolver, seja comendo, seja bebendo. Como provedor de nossas necessidades, o fogão ocupava um lugar estratégico
na cozinha, fosse a gás ou fosse a lenha, afinal, como um objeto sagrado, era o
nosso principal utensílio. Em tempos passados, as casas não tinham aparelho de
microondas, fornos, exaustores, máquinas elétricas entre outros. As
cozinhas eras amplas e geralmente na mesa era onde fazíamos todas as refeições juntamente com aqueles que dividem conosco o dia a
dia. Era este raro momento que tínhamos a oportunidade de sentar, ouvir,
conversar, olhar nos olhos, comungar o pão... e isso ocorria dentro da
cozinha. As refeições eram feitas, quando todos estavam à mesa e cada um
em seus devidos lugares.
Mas os tempos mudaram. Como mudaram. Veio
a arquitetura moderna e contemporânea, as necessidades foram se construindo, as
pessoas foram se coisificando e o desenvolvimento foi forçando a mudança da
cozinha dentro de nossa casa. Ela tem deixado de exercer o papel colocado a ela
desde os tempos antigos. Os apartamentos e casas modernas, tem feito com que
ela quase desaparecesse. Cada vez menor, ela quase tem sido desnecessária
dentro de casa.
As pessoas raramente visitam a cozinha;
não sentam mais à mesa, não comungam e não se confraternizam nela. A sala e os
quartos, tem exercido um papel mais importante. Isolada em um pequeno espaço, a
cozinha permanece tímida, solitária e em vez de mesas temos balcões. Em vez de
cadeiras, permanecemos de pé e o cheiro e os aromas produzidos lá, são substituídos
por latas e saquinhos feitos por industrias
A correria dos tempos modernos, faz com
as pessoas se afastem da cozinha. Nos finais de semana, as famílias buscam
fazer suas refeições fora de casa, e ir para a cozinha no final de semana, é
sinônimo de acumular mais cansaço além do já adquirido durante a semana.
Acontecendo isso, o prazer, as descobertas e os rituais que seriam praticados
dentro da cozinha se perdem e são trocados por outros prazeres, em especial os eletrônicos.
Há quem diga, que mais gostos do que comer na cozinha, é estar nela com os
amigos preparando aquilo que se vai comer. Não é o final, é o processo!
Talvez por isso, que estejamos mais
frios, mais distantes, menos emotivos, mais depressivos, mais egoístas... menos
na cozinha. Se antes comíamos juntos na mesa, hoje, fazemos um lanche rápido
falando ao celular. Se conseguimos nos alimentar em casa, geralmente é cada um
na sua individualidade, no sofá, no quarto, em frente o televisor, com os fones
de ouvido. A correria faz com que não saboreamos o tempero, o cheiro, a
alquimia... não fazemos elogios até porque não sabemos quem fez. Não
agradecemos pelo alimento porque não tempo para isso. Não vamos à cozinha,
porque cozinha é lugar de “Amélia”.
Alguns valores que perdemos, que
parecem simples, levam junto outros valores que fazem falta na nossa construção
como humanos. Talvez seja necessário voltarmos à cozinha sempre. Talvez seja
preciso estar na cozinha com mais frequência, para sorrir, ouvir, comer, sentir
seus cheiros, cores e sabores.
Já pensou qual é o papel da cozinha
dentro da sua casa? Pense nisso!
Paulo Veras é
psicólogo clínico e organizacional, psicanalista, especialista em educação
especial e inclusiva, especialista em docência do ensino superior e professor
universitário em Goiânia-GO.